mencionada por:Marcos Siscar
menciona a:Marcos Siscar
Marília Garcia
Carlito Azevedo
poemas:
BREVE POÉTICA
Todo e qualquer know how poético é absolutamente intransferível. Captar realidades dormentes, mas em conformidade com as reverberações que emanam de um abismo indescritível – ponto em que nos sabemos ser a confluência de pelo menos dois: um Eu mais Outro. Estes não raro se caleidoscopizam no momento poema. Não há momentos poéticos. Há poemas e há momentos que os são. A matéria infinita concentra-se sobretudo no amargor de um cadinho que destila quase todo o terror do mundo: solidão suprema, conselho do silêncio. Quem todo este terror ama – amargo poema solidão caleidoscópica poesia – tem também medos, mas outros. Assemelham-se à sensação que todos temos de querer eternizar certos instantes e nos sabermos impotentes. Assemelham-se ao desejo de fazer com que a pequena morte não tenha mais duração, que rompa o tempo permanecendo enfim, suprimindo a noção duração. Medo de morte porque a única coisa que se sabe eterna é a própria. Morte dos corpos, morte dos poemas, morte das cidades, morte das canções: a morte é eterna, portal supremo, por tal razão é que se a quer quem quer poemas, quem quer de breves fazer infinitos, quem quer olhos retesados diante de quadros tão efêmeros e os tem e os fixa brevemente na eternidade para depois nela morrer.
ENGARRAFAMENTO
Com nós na garganta vejo a fila desses carros parados, antigos amigos me ligam, cobram poemas e sonhos, mal sabem que velhas canções cafonas soam no meu FM. Com o tempo fui ficando piegas. Eles me contam antigos amores, antigas cantilenas, antigos amores. O órgão coração me dói. Velhas cidades me sufocam, não avisto a linha do horizonte como na América do sul, as novas, de lá, jamais permaneceriam em mim. Resta um jorro incrédulo através de minhas pupilas vítreas, por sobre a cidade, cemitério ancião contemporâneo.
menciona a:Marcos Siscar
Marília Garcia
Carlito Azevedo
poemas:
BREVE POÉTICA
Todo e qualquer know how poético é absolutamente intransferível. Captar realidades dormentes, mas em conformidade com as reverberações que emanam de um abismo indescritível – ponto em que nos sabemos ser a confluência de pelo menos dois: um Eu mais Outro. Estes não raro se caleidoscopizam no momento poema. Não há momentos poéticos. Há poemas e há momentos que os são. A matéria infinita concentra-se sobretudo no amargor de um cadinho que destila quase todo o terror do mundo: solidão suprema, conselho do silêncio. Quem todo este terror ama – amargo poema solidão caleidoscópica poesia – tem também medos, mas outros. Assemelham-se à sensação que todos temos de querer eternizar certos instantes e nos sabermos impotentes. Assemelham-se ao desejo de fazer com que a pequena morte não tenha mais duração, que rompa o tempo permanecendo enfim, suprimindo a noção duração. Medo de morte porque a única coisa que se sabe eterna é a própria. Morte dos corpos, morte dos poemas, morte das cidades, morte das canções: a morte é eterna, portal supremo, por tal razão é que se a quer quem quer poemas, quem quer de breves fazer infinitos, quem quer olhos retesados diante de quadros tão efêmeros e os tem e os fixa brevemente na eternidade para depois nela morrer.
ENGARRAFAMENTO
Com nós na garganta vejo a fila desses carros parados, antigos amigos me ligam, cobram poemas e sonhos, mal sabem que velhas canções cafonas soam no meu FM. Com o tempo fui ficando piegas. Eles me contam antigos amores, antigas cantilenas, antigos amores. O órgão coração me dói. Velhas cidades me sufocam, não avisto a linha do horizonte como na América do sul, as novas, de lá, jamais permaneceriam em mim. Resta um jorro incrédulo através de minhas pupilas vítreas, por sobre a cidade, cemitério ancião contemporâneo.
POEMA DÚBIO
Misturar latim com futebol – eis onde reside a verdadeira dificuldade. Misturar dúvidas com dívidas, metafísica com baby-beefs Rubayat – eis aí o meu calcanhar de Aquiles. Viver neste mundo como vivo e viver em outro mundo o meu espírito onde a matéria mais etérea impera. Eu aqui – eu e meu outro lobo. Metafísica com futebol, latim com dívidas, dúvidas com beefs. Nesta tempestuosa noite oceânica o único farol de sentinela é o brilho dos olhos do lobo indomável – este habitante da planície Alma que traga os ventos que sopram os mares que trazem as chuvas que fecundam as terras em que germinam as sementes feitas plantas enquanto os homens matam sua sede de homosapienscianimalidade. No princípio era o Caos, inaudível desordem que cedeu lugar à afinação dos instrumentos cósmicos: os decibéis fizeram-se ouvir, os decibéis da orquestra humana aumentaram desencadeando explosões genocidas. Depois um fechar de olhos. Silêncio. Afinal, funde-se tudo no todo do abismo mais profundo – o abismo que eu perscruto enquanto navego neste oceano que existir é.
POEMETO
Sonetos de Camões às voltas com seus fogos, artifícios de amar às soltas. Do corpo sai dirigida a energia perdida que se extravia na chuva noctívaga incorrigível a secar as chamas que não se vêem, a sepultar extensamente a distância que ilha cada um. Não se vêem tais labaredas. Somente ilhéus. Rochedos. Cadeiras vazias.
(Publicados na Revista Inimigo Rumor n° 17, RJ/Portugal. 2005.)
Dados biográficos:
Flávia Nascimento Falleiros é pesquisadora em Ciências da literatura, e publicou vários ensaios sobre as literaturas francesa, portuguesa e brasileira. Também é tradutora literária. Publicou ainda poemas e prosas nas revistas: Inimigo Rumor (n° 17), Germina, Escritoras Suicidas e Cronópios (essas três últimas, eletrônicas). É doutora em Literatura francesa pela Universidade de Paris X (defendeu uma tese de doutorado sobre o mito literário de Paris: Paris dans la littérature française des années vingt. Contribution à l’histoire de la représentation, Lille, ANRT, 1998, 483 p.). Prepara atualmente um ensaio sobre o escritor francês Julien Gracq.
Uma possível poética:
Tentativa (muito pessoal) de um caminho do meio : entre os atos do intelecto e o suposto encanto arcaico, misterioso e oculto da língua.
Não serve pra nada. E nem acho que deva.
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