menciona a:
(quem ainda não está presente)
Camila do Valle
Masé Lemos
Maurício Matos
Gabriela Nobre
Sebastião Edson Macedo
poemas
CINEMASCOPE
I
A VIDA SECRETA DE BARBARA STANWYCK
ninguém sabia
mas barbara era poeta e odiava o lirismo hipocondríaco
tinha paixão por carros conversíveis
e um namorado depressivo e maníaco
a moça estava cansada de seus óculos escuros
com eles o mundo era sempre noir
e ela
que não conseguia esperar
desejava compulsivamente
as novas lentes varilux
barbara não escrevia versos como quem joga xadrez
desprezava os assíndetos e os oximoros
e aprendia chinês
foi quando o sr. lin
– o professor de chinês que só falava mandarim –
denunciou a estupidez dos homens
e seus pensamentos em off
ela tomou um porre de vodka orloff
e decidiu abandonar hollywood
então armou um golpe fatal
com um quê de experimental
pagaria um piloto de prova
que já estava com o pé na cova
para capotar com o seu MP Lafer
ela receberia uma double indemnity
e viveria feliz em new york city
mas o plano não foi adiante
porque ela detestava destruir veículos
e raciocinava com perspicácia
barbara stanwyck achava que um automóvel tonitruante
era mais belo que a vitória de samotrácia
II
MARROCOS OU ALÉM
W. L. sempre chegava à noite, depois de ter matado baratas
ele precisava escrever o acúmulo viscoso dos devaneios noturnos, os vazios desproporcionais entre a realidade e o fora
sua mulher o beijava e o pó resplandecia na boca, ela desabotoava a blusa, o hálito entrelaçado aos odores da rua
era preciso matá-la
e o médico, um certo doutor B., abria portas janelas corredores oblíquos onde se morre aos poucos com o veneno agudo das lacraias
talvez ele devesse partir para Tanger, estremecer os ossos nos ruídos distantes em meio aos ávidos olhos mouriscos
ou permanecer de pé enquanto o veneno se misturava ao sangue
as palavras infestavam seus ouvidos, ele passava para o outro lado
alguém havia puxado um fio em alguma parte do universo e a trama do mundo se esgarçava
onde estaria sua clarck nova?
ele procurava
e sabia
sabia que o assassinato era uma alucinação na rotina, um espasmo entre as fibras da memória, uma contração nos molares
era preciso escrever ou permanecer para sempre em interzona
III
O NÚMERO TRANSCENDENTE
tudo se passou em chinatown
quando o cérebro esguichava a monocromática
tinta
e ele procurava a decifração do mundo
e os números
da bolsa
as entranhas expostas do computador
cuspiam uma álgebra difusa
confusa
de teclas e letras reluzentes
e uma pálpebra fina junto às outras membranas
congelava o tempo nos chips
de joalheria
depois vieram os rabinos
a cabala o sefer yetzirah
as perseguições casuísticas
a perfuração do hipotálamo
os anagramas convulsivos
as aptidões taumatúrgicas
e os jogos de azar
e ele
que amava insensatamente
os ângulos agudos
contemplava espirais segundo a razão áurea
nas folhas das árvores
na fumaça dos automóveis
na mistura de café com leite numa xícara
e esquecia arquimedes
por fim uma limpidez varava os espaços
tumultuosos
enquanto a transcendência do número brilhava
trivialmente
no sorriso da menina
BREVE BIO/BIBLIO:
Nasci em 1969 no Rio de Janeiro. Sou formada em psicologia, professora e doutoranda em literatura portuguesa. Pari alguns poemas publicados na revista Inimigo Rumor e na Zunái. Também estou prestes a parir uma menina.
POÉTICA:
Cinemascope: processo de filmagem com lentes especiais que deformam anamorficamente as imagens registradas em negativo de 35mm e as recompõem em cada cópia final, positiva, projetada em telas de grandes dimensões.
"O que eu pretendo fazer é distorcer o objeto até um nível que está muito além da aparência, mas, na distorção, voltar a um registro da aparência." (Francis Bacon)
7 comments:
Izabela, bom demais esse seu cinemascope: tem tanta coisa boa, tanta. Beijo do leonardo.
Izabela, parabéns! Gosto de teus poemas. Beso,
Claudio Daniel
Poxa Izabela, muito bacana! bejos, Masé
Ótimos! Fiquei imaginando o livro de onde saíram esses poemas, ou então o livro que sairia desses poemas.
Caio
que surpresa! gostei muito!
bjs, ana.
izabela gostaron muito teus poemas
beijos do bs as
lucas
Adorei ler vocês. : )
Carol
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