Wednesday, September 06, 2006

ROSÁLIA MILSZTAJN


mencionada por:
Paula Glenadel

menciona a:
André Gardel
Christovam de Chevalier
Érico Braga



poemas:

A sopa

de legumes cobriu de nuvem o estômago amaciando de calor seu corpo antes maltratado pelo dia-a-dia.
Tinha planos de felicidade assim como o vidro de maionese fechado, feliz, brilhando na prateleira da cozinha vindo das últimas compras do supermercado.
Nova em vidro. Não mais transparente. Era preciso tecer estórias e mais estórias, fazê-las dobrarem-se sobre si mesmas, acolchoando-se de tempos a serem percorridos. Fazer a vida durar o mais que pudesse e guarnecê-la de consistências.
Tinha abóbora madura, ótimo antioxidante, repolho, muita fibra dizem, para os intestinos, um fio de lembranças de aconchego, de tudo na hora certa, indícios de cuidado
de alguém.
Quero esclarecer que não teve o hábito de tomar sopa de letrinhas na infância e não tinha sido alfabetizada dessa forma.
Foi para a escola e na cartilha aprendeu à duras penas a ler e a escrever, embora não conseguisse com isso, melhor entendimento do mundo e de pessoas.
Foi a sopa neutra sem letras, num sábado qualquer na cozinha de sua casa que iniciou-a na arte de inscrever em si mesma o rumo da vida que bem quisesse.

In, Aqui dentro de mim, editora Aeroplano, 2003.

Ser
Ser para o outro
Ser
Sem ser Auschvitz
Dachau
Buchenvald
Sou
Não sou?

Holocausto
Cicatriz
Herdeira
Ou flor
Mulher
Homem
Crianças

Todos eram

In, Aqui dentro de mim, editora Aeroplano, 2003

A roda
A roda enferrujada do dia
roda lentamente
meu desejo insatisfeito
adoecendo os sentidos

A roda gasta do dia
deglute com cegos dentes
a semente
o amor que poderia

A chuva fria do ferro envelhecido
entristece o futuro e o
pendente

E essa dor atemporal se estende
sem cura no metal ruído
poluí a alvura de fluidos permanentes
que não passam
que não passam

In, Aqui dentro de mim , editora Aeroplano, 2003

A prova

Não fale tanto
Com o tempo
O eco reverbera
E fica insuportável

Cale-se enquanto
É tempo e por dentro
Teça um instrumento
Para a composição da melodia

A melodia quando pronta
Alcança os justos e inocentes
E saberás quem anda ao teu lado

Inédito, a ser publicado in, Ficções e filosofias de um poeta, 2006.

bio/biblio
Rosália Milsztajn é poeta carioca, médica, psicanalista e docente da Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro. Atualmente cursa a pós-graduação da PUC Rio de Janeiro do Curso de Literatura Brasileira - Mídia e Cultura. Publicou No Azul (Imago, 1991), Itgadal –Memória dos Ausentes (Diadorim, 1997), Luminosidades (7 Letras, 2000) e Aqui dentro de mim ( Aeroplano, 2003). Em 1999 venceu o Prêmio SESC de Poesia do Estado do Rio de Janeiro. Seus poemas foram publicados em antologias como Contos e Poemas do Brasil (1990), Por um poema de amor(1995), Oitenta poetas do Rio(1998), Poemas Cariocas(2000), em jornais e revistas como Poesia Sempre (Biblioteca Nacional), Poesia Viva, Rio Letras(RJ), Jalons (Nantes, França), Littero-Cultural(RO), Jornal da internet Agulha, Palavrarte, Patife e outros. Seu quinto livro Ficções e filosofias de um poeta em vias de publicação.




poética
A poesia para mim é uma forma complexa e inteira de ser e estar no mundo. Ao mesmo tempo em que é pensamento, é prazer, é estética é fruição e aprendizagem.

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