Wednesday, September 27, 2006

CADÃO VOLPATO



mencionado por
Heitor Ferraz
menciona a
Francisco Alvim
Micheliny Verunschk
Vincent Katz
poemas
Amsterdam
No restaurante vegetariano
tão alto
o pé direito
e na igreja
o que tanto
conversamos?
no parque
velhos pescadores
devolviam o peixe
ao lago
bicicletas enferrujadas
todas juntas
como uma coroa de espinhos
(já disse isso
o que tanto
conversamos?)
cortinas floridas
nos barcos do canal
onde as pessoas viviam
tudo estava por acontecer
lembra-se?
Mulheres aguardavam nas vitrines
que eu, tão livre em 1994,
fosse até lá colhê-las
e depois as devolvesse à água
sua amiga
de braços torneados
palpáveis
e brancos
Bettina Wilhelm
Exposeert
In Het Rietveld
Paviljoen
Devolvamos
as mulheres
à água
Na água-furtada
onde você morava
e gaivotas faziam ponto
eu observava
o porvir
da sacada
(um moinho velho parado
no tempo
e o vento)
Porvir
onde estamos agora
Tamara

Menina e sapo
pendurada sobre um buraco
com água
onde havia um sapo




Navegação imóvel

1
tímido
não sabe dizer não
ou dizer muito
expressa a dor
de criança
contorcendo-se no escuro
2
como um turco
não existe
sem bigode
um uniforme sujo
a vesti-lo a vida inteira
até o fim do turno
Para ele, o patrão
será sempre
O homem
3
A mão
paisagem escura
áspera
calosa
relevante
pele de elefante
4
graxa e barulho
na fábrica de tecidos
eterno mergulho de trem
na fuligem de um túnel
5
em que navio
chegou o avô
de Verona?
E que belo navio
Era aquele
Que levou seu amigo de volta
À Bota
Deixando conosco
A mobília?
6
deixe que minha canção
homenageie
o dia radiante
em que ele ergueu
o peixe
do tamanho dele
no riacho, aos 7 anos
7
Pompas fúnebres
Na garupa
da bicicleta
Meus pés enroscam
nos aros
Nas canelas dele
Presilhas
Enterraremos o macaquinho
no rio de detritos
Sobre a ponte
o esquife
Um pacote de açúcar
União pai e filho

8
Dote
Vendida
para pagar o casamento
Despedida
no guidão frio
Nas orelhas
vento

bio/biblio+poética:
Aníbal,

Na verdade, não sou poeta. A palavra “poeta” me cai mal. Sinto uma certa vergonha quando a ouço, e não me parece natural nem em Carlos Drummond de Andrade, o que certamente é um absurdo, de tão grande que ele é.
Meus favoritos são (note que não usei a palavra poeta): Ungaretti e Montale. Sou fã dos italianos da ficção, também (Natalia Ginzburg, Elio Vittorini, Italo Calvino, Erre de Luca). Portanto, é um mesmo pacote de afeição.
Faço 50 anos no final do ano.
Sou músico e escritor. Gravei sete discos, com duas bandas e sozinho. Publiquei três livros de contos. Espero nunca mais escrever outros. Por via das dúvidas, acabo de arrematar três novelas, mas desconfio que não passam de contos esticados.
Fiz uma porção de coisas, portanto, mas nada de muito importante.
Minha ignorância sobre o que se faz de poesia no Brasil hoje é total. É para você entender por que não consigo indicar poetas (mas, pensando bem, li Francisco Alvim faz tempo, e Micheliny Verunsky e Vincent Katz, americano da Vila Madalena, recentemente, e gostei. Lembrei que gosto muito de ler poesia).
Os meus “poemas” vão por vaidade ou não sei bem o quê. Talvez possa me purgar deles enviando-os a você. Foram feitos há bastante tempo.
Fique à vontade para usá-los ou não.
Um abraço
do Cadão Volpato

3 comments:

Anonymous said...

Cadão, se sim, se não, não importa. Os poemas estão aí. E você, mesmo não, para mim, é poeta, já não precisa mais se preocupar com fronteiras, com cercas elétricas, muros de concreto, ou coisa assim, separando o cá e o lá da poesia e da prosa. Estou devendo a leitura daqueles originais. Do que li, gostei, gostei muito, mas um dia escrevo com mais vagar. Adorei, mais uma vez, estes poemas de um sim ou não poeta. Um grande abraço, do amigo Heitor

Anonymous said...

Blow up.

Série de desassossego que me transportou para uma despreocupação inusitada.

evoé cadão e continue a nao querer fazer muitas coisas e mas ao mesmo tempo publicando outras.

Anonymous said...

'Não sou poeta'... pára com isso, Cadão. Só pelas letras do Fellini você já tumultua o coro dos poeteiros, pô!
abrazón
RB